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O impacto da atividade irrigada no entorno do Castanhão

Data da publicação: 29 de agosto de 2017 Categoria: Notícias

Espalhado em 325 quilômetros quadrados, o Castanhão é o maior açude público do Brasil. Sozinho, ele é capaz de acumular quase um terço de todas as reservas hídricas do Ceará. O reservatório, no entanto, sofre com a erosão do solo em seu entorno, especialmente nos períodos chuvosos. O desgaste gera não apenas perda do solo (e, portanto, de produtividade) mas também o prejuízo da qualidade de suas águas.

Pesquisadoras do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Solo da Universidade Federal do Ceará identificaram que o impacto erosivo das chuvas é mais forte justamente nas áreas de agricultura irrigada.

Essa característica da erosão traz um problema extra para o açude: como as terras irrigadas receberam uso de fertilizantes e outros insumos, as águas próximas a elas também apresentam maior concentração de nitrogênio e fósforo do que a média, sinal que reforça a necessidade de políticas que melhorem a gestão do solo, alerta o trabalho desenvolvido pela doutoranda Isabel Cristina.

Imagem de vegetação do entorno do Castanhão no primeiro plano, cercando suas águas (Foto: Viktor Braga/UFC)

Açude Castanhão, o maior do País, se espalha por 325 quilômetros quadrados (Foto: Viktor Braga/UFC)

Orientadora da pesquisa, a Profª Mirian Costa explica que, apesar das poucas chuvas que chegam ao semiárido no Ceará, a intensidade delas é alta. Ao cair no solo, a gota da chuva desmancha a porção de terra atingida e favorece que ela seja arrastada pela enxurrada. “A tendência é que esse solo vá parar na parte mais baixa do relevo, geralmente um curso hídrico ou até mesmo um reservatório construído”, complementa.

No solo erodido, podem estar presentes elementos químicos provenientes de fontes naturais ou de atividades agropecuárias desenvolvidas no entorno. Isso contribui para a concentração de nutrientes na água, gerando eutrofização e proliferação excessiva de plantas e algas. A água ganha, assim, uma coloração esverdeada e pode se tornar indisponível para uso, além de prejudicar o ecossistema, causando mortandade de peixes.

PESQUISA

Inicialmente foi feito um levantamento sobre as principais atividades agropecuárias realizadas no entorno do Castanhão, trabalho auxiliado pela técnica de sensoriamento remoto. Definidas as áreas com atividades representativas e com potencial de levar sedimentos ao reservatório, foram instaladas as chamadas parcelas de erosão, estruturas construídas com chapas metálicas que delimitam um espaço de 20 metros quadrados e proporcionam a coleta do solo erodido de modo localizado.

Técnicos preparam uma tira de alumínio que irá isolar uma área degradada do entorno do Castanhão (foto: Isabel Cristina)

Técnicos preparam a parcela de erosão, instrumento utilizado para a coleta de informações sobre a quantidade de terra erodida. Nessa foto, a parcela avaliou uma área já degradada (Foto: Isabel Cristina)

Técnico prepara a tira de alumínio em área com plantação (Foto: Isabel Cristina)

Técnicos preparam a parcela de erosão em uma área de agricultura irrigada (Foto: Isabel Cristina)

Parcelas de erosão instaladas em uma área de sobrepastejo. (Foto: Isabel Cristina)

As parcelas de erosão auxiliam a coleta do solo erodido, que é carreado para tanques instalados subterraneamente. (Foto: Isabel Cristina)

A pesquisadora optou por realizar a análise em três áreas distintas no entorno do Castanhão: uma de mata nativa, com o menor grau possível de interferência humana; uma área desmatada, utilizada pelos produtores apenas para sobrepastejo (quando o número de animais que pastam é maior do que a capacidade da área de fornecer alimento); e outra onde é desenvolvida atividade irrigada de agricultura, o foco da pesquisa. Como resultado, a pesquisadora descobriu que apenas a área irrigada apresentou erosão.

Isabel Cristina explica que, onde havia mata nativa, o processo de degradação era evitado em parte por conta da própria vegetação, que reduzia o impacto das gotas da chuva. “Nossa caatinga tem a característica chamada caducifólia, pelo qual perde suas folhas, por proteção, no momento da seca, mas, quando chove, ela logo floresce, retendo o processo erosivo”, comenta.

“Após anos e anos de acúmulo de sedimentos no fundo do reservatório, a capacidade de armazenamento de água vai diminuindo”

A não ocorrência de carreamento na área desmatada pode ser explicada pela pouca incidência de chuva no período de coleta (a máxima chuva registrada no período de avaliação diária foi de 40 milímetros, de agosto de 2014 a fevereiro de 2016) e pela característica física do solo, arenoso e de maior profundidade. “O processo de infiltração é maior. Para que esse solo chegasse a saturar e formar enxurrada para carrear sedimento, teria de haver uma intensidade de chuva muito maior”, explica.

A baixa precipitação, porém, não evitou a erosão na área irrigada. Diferentemente das outras, essa área tem solo com menor profundidade, com uma camada de impedimento mais próxima da superfície, e maior declividade, facilitando seu carreamento. Outro fator que favoreceu à erosão na área irrigada foi a constante umidade à qual a terra é submetida pela atividade agrícola. Assim, o ponto de saturação – quando não é mais possível absorver a chuva e, em consequência, ocorre a erosão – é alcançado mais rapidamente do que nas áreas secas.

Além do impacto da erosão na qualidade da água e da perda de produtividade das áreas erodidas, a Profª Mirian alerta sobre a consequência que o carreamento do solo tem na alteração da capacidade do açude. “Após anos e anos de acúmulo de sedimentos no fundo do reservatório, a capacidade de armazenamento de água vai diminuindo. Daqui a algum tempo, se houver chuvas excessivas, podem ocorrer transbordamentos”, explica.

PREVENÇÃO

No intuito de diminuir o impacto erosivo das atividades agrícolas, as pesquisadoras defendem o uso de práticas conservacionistas pelos produtores. Práticas mecânicas (construção de terraços, por exemplo), vegetativas (manutenção da cobertura vegetal, que diminui o impacto da chuva) ou edáficas (correta aplicação de adubos) podem contribuir para que uma menor quantidade de solo seja perdida.

“No momento em que os sedimentos são perdidos, temos dois impactos: tanto uma possível contaminação da água quanto perda de solo com caráter produtivo. O produtor também está perdendo”, alerta Isabel.

Assim, o próximo passo é levar os resultados encontrados na pesquisa à gestão pública, propondo a adoção de práticas que possam prevenir a degradação. “Não vamos mudar a característica das chuvas’, que é uma questão natural. O que temos que mudar é a gestão frente ao nosso semiárido”, afirma.

Fonte: Profª Mirian Cristina Gomes Costa, do Departamento de Ciências do Solo da UFC – e-mail: mirian.costa@ufc.br

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